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Redação do Site Inovação Tecnológica – 22/01/2021
Os fsicos tentaram encontrar a matria escura usando radiotelescpios, mas os xions ainda no apareceram.
[Imagem: GBO/AUI/NSF]
Spoiler csmico
Se os fsicos tivessem descoberto o que a matria escura, voc provavelmente estaria ouvindo falar disso at nas rdios FM.
Eles ainda no descobriram.
Contudo, embora comece com esse anticlmax, esta uma histria que merece ser contada porque ela muito provavelmente no chegou ao final.
O enredo envolve uma forma totalmente nova de procurar pela matria escura: Tentar encontr-la perto das estrelas de nutrons, restos de ncleos muito densos de estrelas massivas que explodiram sob a forma de supernovas no final das suas vidas. Elas possuem o que provavelmente so os campos magnticos mais fortes do Universo, bilhes de vezes mais fortes do que o campo do nosso Sol.
Mas, como toda histria, necessrio buscar onde tudo comeou.
Simetria e quebra de simetria
Na dcada de 1970, os fsicos descobriram um problema com o Modelo Padro da fsica de partculas, a teoria que descreve trs das quatro foras fundamentais da natureza – interaes eletromagnticas, fora fraca, fora forte e gravidade.
Eles descobriram que, embora a teoria preveja uma quebra de simetria entre as partculas e foras em nosso Universo e suas verses em espelho, os experimentos dizem o contrrio.
Esta incompatibilidade entre a teoria e as observaes conhecida como “problema da CP Forte” – CP significa Carga + Paridade. Ento necessrio entender qual este problema da CP e por que ele vem escorregando entre os raciocnios dos fsicos por quase meio sculo.
No Modelo Padro, o eletromagnetismo simtrico, ou seja, se voc pegar uma partcula e substitu-la por sua antipartcula (reverso de conjugao de carga, ou C), inverter o tempo (reverso temporal, ou T) e coloc-la num espelho especial que no apenas a inverta da esquerda para a direita, mas tambm de cima para baixo (reverso de paridade, ou P), ento voc deve ter os mesmos resultados que qualquer experimento feito na partcula original. A isso, somem-se as combinaes das operaes de simetria CP, CT, PT e CPT.
Isso significa que experimentos sensveis interao eletromagntica no devem ser capazes de distinguir os sistemas originais daqueles que foram transformados por qualquer uma das operaes de simetria. Neste caso, diz-se que a simetria foi conservada. Se for possvel fazer a distino, ento a simetria foi violada.
No caso da interao eletromagntica, a teoria corresponde muito bem s observaes. Como antecipado, o problema est em uma das duas foras nucleares – “a interao forte”. Como se constatou, a teoria permite violaes da operao de simetria combinada CP (refletindo partculas em um espelho e, em seguida, trocando partcula por antipartcula) para as interaes fraca e forte.
No entanto, as violaes de CP foram observadas at agora apenas para a interao fraca.
Mais especificamente, para as interaes fracas, a violao de CP ocorre aproximadamente no nvel 1 em 1.000, e os fsicos esperavam um nvel semelhante de violaes para as interaes fortes. No entanto, experimentalistas procuraram extensivamente por uma violao de CP, mas sem sucesso. Se ela ocorrer na interao forte, ela est sendo suprimida por um fator de mais de um bilho (109).
Dizemos que a simetria CP violada se observarmos que o sistema original (None) decai em uma partcula diferente do sistema CP transformado (CP).
[Imagem: Kavli/IPMU]
xion
Em 1977, os fsicos tericos Roberto Peccei e Helen Quinn propuseram uma soluo possvel: Eles levantaram a hiptese de uma nova simetria que suprima os termos que violam CP na interao forte, fazendo com que a teoria corresponda s observaes.
Pouco depois, Steven Weinberg e Frank Wilczek – os quais ganharam o Prmio Nobel de Fsica em 1979 e 2004, respectivamente – perceberam que esse mecanismo hipottico cria uma partcula inteiramente nova. Wilczek acabou batizando essa nova partcula de “xion”, em homenagem a um detergente muito popular, que tem esse nome, pela capacidade da partcula de “limpar” o problema da CP Forte.
O xion deve ser uma partcula extremamente leve, ser extraordinariamente abundante e sem carga. Devido a essas caractersticas, os xions so excelentes candidatos a serem o material constituinte da matria escura. A matria escura representa cerca de 85% do contedo de massa do Universo, mas sua natureza fundamental continua sendo um dos maiores mistrios da cincia moderna. Descobrir que a matria escura feita de xions seria uma das maiores descobertas da fsica moderna.
Finalmente, em 1983, o fsico Pierre Sikivie descobriu que os xions tm outra propriedade notvel: Na presena de um campo eletromagntico, eles s vezes deveriam se converter espontaneamente em ftons facilmente detectveis.
Com isto, o que antes se pensava ser completamente indetectvel com a tecnologia disponvel, acabou sendo potencialmente detectvel, desde que haja uma concentrao suficientemente alta de xions junto a campos magnticos muito fortes.

xions em estrelas de nutrons
Chegamos ento, finalmente, s estrelas de nutrons, que tm alguns dos campos magnticos mais fortes do Universo.
Uma vez que esses objetos so muito massivos, eles tambm poderiam atrair um grande nmero de xions para suas cercanias. Ento, os fsicos propuseram procurar de sinais de xions – e, portanto, da matria escura – nas regies circundantes das estrelas de nutrons.
Entram em cena Joshua Foster e seus colegas do Instituto Kavli de Fsica e Matemtica do Universo, sediado na Universidade de Tquio. Eles decidiram procurar sinais dos xions usando dois radiotelescpios – o Robert Byrd Green Bank, nos EUA, e o Radiotelescpio Effelsberg 100, na Alemanha.
Os alvos foram duas estrelas de nutrons prximas, conhecidas por terem fortes campos magnticos, e o centro da Via Lctea, que se estima hospedar meio bilho de estrelas de nutrons. A equipe amostrou frequncias de rdio na faixa de 1 GHz, que correspondem a xions com massas entre 5 e 11 microeltron-volt.
E a vem o final j conhecido: Eles no detectaram os xions. Contudo, a equipe foi capaz de impor os limites mais fortes at o momento para essas hipotticas partculas de matria escura, que devero ter uma massa abaixo dessa faixa, bem menor do que se esperava.
Quase ao mesmo tempo, uma equipe financiada pela NASA no encontrou sinais de xions perto da superestrela Betelgeuse, que no uma estrela de nutrons, mas est bem prximo de explodir em uma supernova – prximo em termos cosmolgicos – e, por sua atividade deveria estar produzindo um bocado de xions. Mengjiao Xiao e seus colegas tambm estabeleceram restries de massa para as partculas hipotticas, neste caso entre 3,5 e 5,5 microeltron-volt.
[Imagem: D. Ducros/ESA/XMM-Newton]
Prximos captulos
Um dos motivos pelos quais os fsicos continuam entusiasmados com os xions – alm do fracasso na procura pelos WIMPS – deve-se ao seu idealizador.
Frank Wilczek tem “acertado a mo” em muitas de suas descobertas. No foi por acaso que ele recebeu o Nobel de Fsica, mas depois disso ele j demonstrou que a Fora de Casimir pode ser revertida e at ajustada e previu a existncia dos cristais do tempo, agora j demonstrados experimentalmente.
Alm disso, mais recentemente uma equipe do Laboratrio Nacional Lawrence Berkeley, nos EUA, demonstrou que os xions tambm podem estar envolvidos em emisses de raios X muito fortes, que tm sido detectadas prximas a estrelas de nutrons, e que at agora permanecem sem explicaes.
E eles at j encontraram um alvo para testar sua teoria: Um conjunto de estrelas de nutrons conhecido como as “7 Magnficas”. Esse conjunto fornece um excelente alvo para procurar xions porque essas estrelas possuem campos magnticos muito fortes, esto relativamente prximas – algumas centenas de anos-luz – e s deveriam produzir raios X de baixa energia e luz ultravioleta.
Assim, os xions podem ser os atores por trs dos raios X de alta energia detectados nas 7 Magnficas, algo que os fsicos chamam de “excesso de raios X”.
“Estamos bastante confiantes de que esse excesso existe, e muito confiantes de que h algo novo no meio desse excesso. Se tivssemos 100% de certeza de que o que estamos vendo uma nova partcula, isso seria grandioso. Isso seria revolucionrio na fsica,” disse o pesquisador Benjamin Safdi, um dos proponentes dessa nova busca.
Com isto, no poderemos dar um novo spoiler sobre o que vir a seguir. Resta esperar o lanamento da nova temporada, que vir contar o resultado das observaes das 7 Magnficas.
Artigo: Green Bank and Effelsberg Radio Telescope Searches for Axion Dark Matter Conversion in Neutron Star Magnetospheres
Autores: Joshua W. Foster, Yonatan Kahn, Oscar Macias, Zhiquan Sun, Ralph P. Eatough, Vladislav I. Kondratiev, Wendy M. Peters, Christoph Weniger, Benjamin R. Safdi
Revista: Physical Review Letters
DOI: 10.1103/PhysRevLett.125.171301
Artigo: Axion Emission Can Explain a New Hard X-Ray Excess from Nearby Isolated Neutron Stars
Autores: Malte Buschmann, Raymond T. Co, Christopher Dessert, Benjamin R. Safdi
Revista: Physical Review Letters
DOI: 126, 021102
Artigo: Constraints on Axionlike Particles from a Hard X-Ray Observation of Betelgeuse
Autores: Mengjiao Xiao, Kerstin M. Perez, Maurizio Giannotti, Oscar Straniero, Alessandro Mirizzi, Brian W. Grefenstette, Brandon M. Roach, Melania Nynka
Revista: Physical Review Letters
Vol.: 126, 031101
DOI: 10.1103/PhysRevLett.126.031101
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